Eu, o repórter cinematográfico Ronaldo Balla, o técnico José Reinaldo e o produtor Sérgio Carvalho saímos de carro de Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul. Traçamos um roteiro e começamos pelo lado triste: carvoarias. Fornos queimam dia e noite e fornecem combustível natural para as siderúrgicas do Sudeste e Centro Oeste. Uma cena de dar dó. Não combina, é uma contradição triste, que mostra a realidade de um lugar que agoniza silenciosamente. E fomos nós, atrás de histórias. A do peão que virou carvoeiro foi uma descoberta do acaso. Eu estava sentada num tronco no meio da carvoaria batendo papo com o funcionário, quando ele me contou que era da região e que ficava muito triste por estar ajudando a destruí-la. Uma história de vida comovente. Vânio Ramão Guedes, ou seu Nico, o peão carvoeiro.
Tristezas à parte, fomos atrás das salinas! Por causa delas, as tais lagoas de água salgada, surgiu a lenda de que o Pantanal foi mar: o Mar de Xaraés. Tudo invenção de conquistadores em séculos passados. O lugar nunca foi mar. No máximo, um deserto. E para chegar à região, são 130 quilômetros de estrada de terra Pantanal adentro.Velocidade: 40 quilômetros por hora, quando estamos correndo! E dá-lhe ponte. Contei 13. E são aquelas pinguelinhas de madeira, que você reza para não desabar. E as porteiras? Só nessa viagem até a fazenda onde íamos filmar as salinas foram 37! Detalhe: elegemos o produtor para ser o "menino da porteira". Coitado! Abriu todas na ida e na volta. E como no Pantanal não há placa de sinalização na estrada, o jeito é se guiar pelas fazendas. Eu, Reinaldo e Balla, que já percorremos a região há dez anos, conhecemos bem os caminhos. Mas como Pantanal é sempre uma surpresa, eis que estávamos quase na fazenda quando a "navegadora" aqui falou: “Vira ali naquela porteira que vamos entrar na terra das salinas”. Entramos e... nos perdemos. Quase uma hora depois, voltamos à mesma porteira. Andamos em círculo. Quando estávamos ficando preocupados, olhamos para o chão e tinha lá, caída na areia, uma pequena placa: Fazenda Barranco Alto. Era só entrar e percorrer uns míseros quilômetros para chegar à sede. Demos boas gargalhadas. O produtor desceu do carro e fez pose com a plaquinha para não nos perdermos de novo.
Mas tudo bem. Se perder às vezes é bom para entender a imensidão pantaneira. Ficamos três dias no local. Um sol lindo, uma luz maravilhosa, uma paisagem fantástica e um defeito: carrapatos! Me embrenhei no mato e, por conta disso, peguei todos os carrapatos que estavam por perto. Contei 53 e desisti de tentar fazer o ranking. Passei remédio e pedi a Deus para eles largarem meu corpo. Coça demais! Um horror.
Da região do Rio Negro, fomos para o Rio Miranda. Águas que já foram consideradas as mais fartas em peixes e onde agora não é nada fácil fisgar um peixão como troféu. Entramos no rio às 7h e saímos à meia-noite. Um frio danado.
Nessas viagens, restaurante é coisa que não existe. Tínhamos ou que comer nas fazendas que recebem turistas ou levar lanche. Nos entupimos de pão com queijo. E os famosos "rói-rói", apelido carinhoso que demos aos biscoitinhos de sal estilo "tranqueira", que fazem qualquer nutricionista torcer o nariz.
Uma coisa que ninguém imagina: em junho faz frio no Pantanal. Durante os 18 dias de gravações, enfrentamos um frio de rachar. Pior: em alguns lugares onde dormimos não tinha energia, e o banho era gelado mesmo.
Quando estávamos indo ao Nabileque, uma região isoladíssima, levamos quatro horas e meia para percorrer 83 quilômetros. A chuva transformou a estrada em um atoleiro esburacado. O carro "pulava" tanto que tínhamos que fazer paradas rápidas para esticar as pernas e tentar colocar os ossos no lugar. No fim do dia, ainda tivemos de deixar o carro na margem do Rio Nabileque, pegar o barco à noite e nos embrenhar pelos aguapés até chegar à fazenda onde gravaríamos a onça e o peão fazendeiro. Deu um medo danado, porque barco não tinha farol. Eu rezava quietinha para chegar logo. E por falar em rezar, estou devendo a Nossa Senhora umas três promessas e uns cinco anos de Ave-Maria. Eu explico: fomos gravar a onça-pintada no lugar onde a "bicha" fica ilhada e ataca o gado. Até aí, tudo bem. Fomos a cavalo (mais carrapato!!!) e depois entramos a pé pela mata. Meu coração quase explodiu no peito. Eu ia atrás da dona Eronildes, que mora na fazenda e não tem medo de onça. A matilha disparou pelo mato. Um cheiro de onça me arrepiava os cabelos (onça tem um cheiro característico: meio adocicado, meio de carne) A equipe ia atrás dos cães e nada da onça. Mas eu sentia que ela estava ali, nos olhando. O risco de algo dar errado era tão iminente que chegou uma hora em que fiquei com muuuuuuito medo e empaquei. Abri os braços no meio da mata e gritei: “PÁRA TUDO!!! ESSE NEGÓCIO TÁ PERIGOSO, E ACHO QUE TEMOS DE VOLTAR!!!". Só que não dava para falar para a onça que a gente tinha desistido dela. Mas a equipe entendeu, e finalmente saímos do mato.
Para nós, essa aventura foi um grande prazer. Espero que vocês também tenham se divertido e viajado com a gente por esse pedaço de Brasil.
Um abraço e até a próxima,
Cláudia Gaigher Repórter
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